Archive for the 'negócios' Category

dezesseis

20/05/2010

analisando a tabela abaixo podemos concluir que as empresas, em sua grande maioria, se anteciparam ao credit crunch que teve início em 2007. a quantia média de dinheiro disponível nos tesouros das firmas mais do que dobrou desde 1980, chegando aos incríveis 23% (cash-to-asset ratio) um ano antes do estopim financeiro! fico imaginando o que teria acontecido com a economia mundial se as empresas continuassem com uma média de 10% de cash ratio… ia ser o inferno!

doze

21/04/2010

em uma nota anterior, eu publiquei um gráfico que mostra como os investidores internacionais (fora dos eua) aumentaram a participação das mortgage-backed securities nos seus portfólios. eu não tenho como negar que esses tipos de ativos financeiros foram um dos principais responsáveis por levar a crise financeira para os outros setores da economia, e principalmente para outros países. no entanto, banir as mortgage-backed securities (mbs) do mercado trará muito mais perdas do que ganhos para a sociedade. para argumentar em favor desse ponto de vista, primeiro é preciso entender o que é uma mbs.

quando as pessoas querem comprar uma casa, é possível ir até um banco e pedir um empréstimo. como garantia, é comum que as pessoas dêem as próprias casas que elas adquiriram com o o dinheiro tomado no banco. no entanto, o número de empréstimos que cada banco oferece aos seus clientes é limitado por um determinado nível de risco. ou seja, suponha que o banco dá o primeiro empréstimo para o melhor cliente (aquele que tem o menor risco de crédito), o segundo empréstimo para o segundo melhor cliente, e assim por diante. chegará uma hora que o banco não estará mais disposto a oferecer crédito, pois o risco associado aos empréstimos se torna muito grande. no entanto, se o banco pudesse repassar o risco atrelado aos clientes de menor qualidade para investidores mais agressivos, é bem provável que o banco expandiria seu crédito para um público muito maior.

a grande jogada das mortgage-backed securities é que elas permitem a diversificação do risco de crédito entre um grande número de agentes econômicos, permitindo que o banco dê muito mais crédito do que em uma situação sem as mbs. por exemplo, imagine que a fannie mae concedeu um empréstimo igual no valor de $100,000 para 1,000 pessoas diferentes. esses empréstimos podem ser pagos em 10 anos, com uma taxa de juros de 10% ao ano, e o fluxo de caixa que o banco espera receber foi simplificado por motivos didáticos (ver a primeira figura). assim, o valor total dos empréstimos é de $100 milhões.

mortgage-backed securities

fazendo uso de uma matemática elementar, para cada um dos empréstimos concedidos, a fannie mae espera receber de volta $200,000 em juros e principal ao final dos dez anos (ignoremos a questão da taxa de desconto intertemporal). como foram concedidos 1,000 empréstimos similares, o valor total desse portfólio de empréstimos é de $200 milhões. veja que até, o momento, todo o risco de crédito recai sobre a fannie mae.

agora imagine que, por algum motivo de urgência financeira, a fannie mae precise urgentemente de dinheiro. uma alternativa que ela tem é vender todo o seu portfólio de empréstimos para um banco de investimento, repassando o direito ao fluxo de caixa desse portfólio em troca de uma quantia de dinheiro. no nosso exemplo, a goldman sachs paga $150 milhões pelo portfólio, e a fannie mae sai da jogada lucrando $50 milhões.

mortgage-backed securities

agora todo o risco está nas mãos da goldman sachs, que também é quem tem o direito a receber os pagamentos dos empréstimos concedidos pela fannie mae. para tirar esses ativos de risco de seus balanços contábeis, a goldman sachs abre uma nova empresa conhecida como special purpose entity (spe) e transfere todos os empréstimos para essa nova entidade. os bancos de investimento fazem isso normalmente por causa de questões regulatórias, que limitam o montante de capital de risco que eles podem ter em seus ativos.

finalmente, a spe montada pela goldman sachs emite papéis atrelados ao pagamento desses empréstimos. seguindo nossa história, suponha que a spe emita 1 milhão de papéis idênticos cujo retorno depende do pagamento dos empréstimos. imagine também que cada papel desses foi vendido por $160, somando um total de $160 milhões. esses papéis é que são as famosas mortgage-backed securities. como resultado da emissão de mbs, a goldman sachs – através da sua special purpose entity – transformou um portfólio de risco em cash, lucrando de $10 milhões ($150M foi o que a goldman pagou para a fannie mae, e $160M foi o valor arrecadado com a emissão de mbs).

mortgage-backed securities

concluindo, as mbs permitem que o risco de crédito seja diversificado entre milhares de agentes econômicos, o que acaba por aumentar o volume de crédito direcionado a pessoas que querem comprar um imóvel. caso esses instrumentos financeiros sejam banidos do mercado, o banco gerador dos empréstimos não poderá repassar o risco para o banco de investimentos que, por sua vez, não poderá repassar o risco para agentes dispersos. no final das contas, o banco comercial acaba por reduzir sua carteira de crédito, e quem acaba sofrendo são as pessoas que não conseguem comprar seus desejados imóveis.

* a análise acima é válida pra qualquer outro tipo de asset-backed security.

** no exemplo eu desconsiderei diversos fatores pra simplificar a análise (taxa de desconto, fluxo de caixa, probabilidade de default, etc.).

*** peço desculpas pelas minhas ilustrações toscas, mas penso que fica mais fácil de entender com elas.

dez

19/04/2010

toda crise financeira tem uma mecanismo de contágio doméstico, e diversas crises também tem uma mola responsável por levar a crise para outros países do mundo. o gráfico abaixo – que mostra o quanto cada tipo de investidor investiu em mortgage-backed securities entre 2003 e 2007 – deixa claro qual foi a bomba dos últimos anos…

mbs ownership

Source: Inside Mortgage Finance Publications

quatro

13/04/2010

as circunstâncias moldam as preferências, e isso também é verdade para alunos. comecei meu mestrado no mesmo mês que o lehman entrou em falência, e não há como negar que os acontecimentos que se seguiram tiveram um grande impacto na minha maneira de encarar o mundo. olhando para trás, o maior impacto da crise financeira sob a minha pessoa enquanto estudante foi uma mudança de foco de questões totalmente teóricas para motivações mais práticas.

assim, comecei a me interessar pelo estudo de como a teoria econômica interage com a prática em duas esferas distintas: negócios corporativos e políticas públicas. quanto mais eu tentava entender a relação teoria-prática, maior era o desconforto que eu sentia devido ao grande vão existente entre esses dois espaços. ao mesmo tempo, ficou claro pra mim que o abismo existente entre a teoria e a prática no mundo dos negócios é qualitativamente muito diferente daquele que encontramos nas políticas públicas.

enquanto que no setor público o grande problema é o baixo fluxo de informações que vai da teoria para quem a pratica, no setor corporativo o obstáculo está na quase total negligência de economistas acadêmicos com o que se passa dentro das empresas e corporações.

não é à toa, então, que grande parte da crise financeira  pode ser atribuída às lamentáveis decisões tomadas pelos reguladores e operadores da política monetária durante os últimos anos. de maneira similar, com esses pontos em mente também é possível compreender por que existem tão poucos economistas ocupando cargos executivos dentro de empresas, e por que a maioria das firmas preferem dar ouvidos a “gurus da administração” do que a qualquer ganhador do prêmio nobel de economia.